Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP)


A atualização afirma que a SOP deve ser diagnosticada conforme o Guideline Internacional Baseado em Evidência de 2018, construído a partir dos critérios de Rotterdam/2003, o que requer a presença de dois dos seguintes achados: i) hiperandrogenismo clínico/bioquímico; ii) disfunção ovulatória; e iii) ovários policísticos ao ultrassom (US). Em 2023, alternativamente, o hormônio anti-mulleriano (AMH) pode ser usado, substituindo o ultrassom. Devem-se excluir outras etiologias. É importante ressaltar que, quando ciclos menstruais irregulares e hiperandrogenismo estão presentes, o diagnóstico é simplificado e, neste caso, o US e o AMH não são necessários. Em adolescentes, tanto o hiperandrogenismo quanto a disfunção ovulatória são necessárias, pois US e AMH não são recomendados devido à baixa especificidade. O AMH foi destacado em 2018 e as evidências atuais são suficientes para incluí-lo nesta nova recomendação, o que poderá mudar significativamente a prática.

Uma vez diagnosticada a SOP, a avaliação e o manejo devem abordar aspectos reprodutivo, metabólico, cardiovascular, dermatológico, do sono e características psicológicas. Recomenda-se um planejamento a longo prazo, incluindo um estilo de vida saudável, a prevenção de ganho excessivo de peso, a otimização da fertilidade, fatores de risco e prevenção e tratamento de doenças clínicas. Um risco aumentado de câncer endometrial na pré-menopausa também deve ser reconhecido, embora os riscos absolutos permaneçam baixos. Os sintomas de depressão e ansiedade aumentam significativamente e devem ser rastreados em todas as mulheres com SOP, com avaliação psicológica e terapia, conforme indicado.

A seguir, estão resumidos aspectos relevantes do rastreio, diagnóstico, avaliação de risco e estilo de vida.

CICLOS MENSTRUAIS IRREGULARES

Ciclos menstruais irregulares são um achado normal no primeiro ano pós menarca – transição puberal.
> 1 a < 3 anos pós menarca: ciclos irregulares são < 21 ou > 45 dias;
> 3 anos pós menarca até a perimenopausa: ciclos irregulares são < 21 ou > 35 dias ou < 8 ciclos por ano;
1 ano após a menarca > 90 dias para qualquer ciclo.
Amenorreia primária aos 15 anos ou > 3 anos após telarca.

Com ciclos irregulares, a SOP deve ser considerada e investigada de acordo com o guideline. Disfunção ovulatória pode ocorrer com ciclos regulares. Se a anovulação é suspeita, os níveis de progesterona podem ser verificados.

HIPERANDROGENISMO BIOQUIMICO

Testosterona total e livre são usadas para o diagnóstico. Se normais, a androstenediona e o sulfato de dehidroepiandrosterona (SDHEA) poderão ser mensurados, mas são menos específicos e têm papel limitado no diagnóstico da SOP. São recomendados os ensaios altamente acurados por espectrometria de massas em tandem (LC-MS-MS). Os ensaios de dosagem direta de testosterona livre não são recomendados. A avaliação bioquímica de hiperandrogenismo não é possível com o uso de contraceptivos hormonais. Deve-se considerar sua suspensão por > 3 meses, com alternativa para contracepção. O hiperandrogenismo bioquímico tem utilidade quando o hiperandrogenismo clínico não está claro. Quando as concentrações estão bem abaixo dos níveis de referência, outras condições devem ser consideradas. A história clínica considerando início e progressão dos sintomas é a chave para a avaliação de neoplasia, entretanto, algumas neoplasias produtoras de hormônios poderão induzir a hiperandrogenismo leve / moderado.

HIPERANDROGENISMO CLÍNICO

História clínica e exame físico são necessários. Em mulheres adultas, avaliar: acne, padrão feminino de perda de pêlos e hirsutismo; em adolescentes: acne severa e hirsutismo. Avaliar impacto psicossocial do hiperandrogenismo clínico. A percepção do paciente é importante, sem considerar a aparente severidade clínica. Escalas padronizadas para avaliação visual são preferidas, incluindo o score de Ferriman Gallway modificado, um score 4 – 6 = hirsutismo, observando os impactos do autotratamento. A Escala visual de Ludwig é preferível para avaliação de mulheres com padrão feminino de perda de pêlos.

ULTRASSOM (US) E MORFOLOGIA OVARIANA POLICÍSTICA (MOP)

Com ciclos menstruais irregulares e hiperandrogenismo, o ultrassom ovariano não é necessário. Para o diagnóstico, o número de folículos por ovário é mais efetivo, seguido pelo número de folículos por corte transversal e o volume ovariano em mulheres adultas. O US não é usado para diagnóstico de SOP em adolescentes, devido à alta incidência de ovários multifoliculares neste estágio. O US transvaginal é preferido, se vida sexual ativa e aceito pela paciente. Com transdutores com frequência de 8 MHZ, o limite para MOP são > 20 folículos por ovário e/ou um volume ovariano > 10 ml, evitando corpo lúteo, cistos ou folículos dominantes. O AMH pode ser usado para definição de MOP, em mulheres adultas, como alternativa ao US pélvico. O AMH ou o US podem ser usados, mas não ambos, para evitar sobrediagnóstico.

HORMÔNIO ANTI-MULLERIANO (AMH)

O AMH sérico pode ser usado para definir MOP em mulheres adultas, como alternativa ao US pélvico. O AMH sérico não é recomendado como teste único para diagnóstico de SOP.

VARIAÇÃO ÉTNICA E PREVALÊNCIA

Os profissionais de saúde devem estar cientes da alta prevalência da SOP em todas as etnias e em todas as regiões do mundo, variando de 10% a 13% globalmente, pelos Critérios de Roterdam.

ESTILO DE VIDA NA MENOPAUSA

Um diagnóstico de SOP pode ser considerado duradouro. Os profissionais de saúde podem considerar que, tanto clínico como bioquímico, o hiperandrogenismo persiste na pós-menopausa em mulheres com SOP. O diagnóstico pode ser considerado pósmenopausa, se houver um diagnóstico anterior, ou uma história de longo prazo de oligo-amenorreia com hiperandrogenismo e/ou MOP, durante os primeiros anos reprodutivos (20 – 40 anos). Investigações adicionais devem ser consideradas para descartar tumores secretores de andrógenos e hipertecose ovariana em mulheres na pós- enopausa que apresentam sintomas recentes, hiperandrogenismo grave ou agravamento, incluindo hirsutismo.

RISCO DE DOENÇA CARDIOVASCULAR

Mulheres com SOP devem ser consideradas com risco cardiovascular aumentado, mas reconhecendo que o risco geral de doença cardiovascular na pré-menopausa é baixo. Todas as mulheres com SOP devem ser avaliadas quanto a fatores de risco para doenças cardiovasculares e, independentemente da idade e IMC, devem dosar perfil lipídico (colesterol, colesterol LDL, colesterol HDL e triglicerídeos) no momento do diagnóstico. Depois disso, a frequência da mensuração deve basear-se na presença de hiperlipidemia e fatores de risco adicionais ou cardiovascular. Todas as mulheres com SOP devem medir a pressão arterial anualmente e quando planejar gravidez ou estiver em tratamento de fertilidade.

INTOLERÂNCIA À GLICOSE

O risco de tolerância alterada à glicose e o diabetes mellitus tipo 2 (DM) está aumentado na SOP. Como um fator de risco independente, exacerbado pelo IMC, a avaliação da glicemia deve ser feita em todas as mulheres com SOP na consulta inicial e, então, a cada dois ou três anos, baseado na presença de outros fatores de risco para DM (incluindo IMC > 25 kg/m2 ou em asiáticos > 23 kg/m2, história de tolerância à glicose alterada ou história familiar de diabetes, hipertensão ou etnia de alto risco). Em mulheres de alto risco, um teste de tolerância oral à glicose (TTOG) é mais acurado para disglicemia. Se um TTOG não puder ser realizado, a glicemia plasmática em jejum e/ou a hemoglobina glicada (HbA1c) poderão ser considerados, observando uma precisão reduzida. O TTGO deve ser oferecido no planejamento de gravidez ou na mulher com SOP buscando tratamento de infertilidade, devido ao aumento de hiperglicemia e comorbidades na gestação. Se não realizado antes da concepção, o TTOG deve ser oferecido na primeira consulta pré-natal e, para todas as mulheres com SOP, deve ser ofertado o teste entre 24-28 semanas de gestação. O estado glicêmico deve ser reavaliado a cada 1-3 anos, com base em fatores de risco individuais adicionais para diabetes.

APNEA OBSTRUTIVA DO SONO

Mulheres com SOP têm significativamente maior ocorrência de apneia obstrutiva do sono e devem ser avaliadas quanto a sintomas (isto é, ronco em combinação com acordar sem descanso do sono, sonolência diurna ou fadiga) e, se presentes, devem ser examinadas com ferramentas validadas ou encaminhadas para avaliação.

CÂNCER ENDOMETRIAL

Os profissionais de saúde devem estar cientes de que mulheres na pré-menopausa com SOP apresentam risco significativamente maior de desenvolver hiperplasia e câncer endometrial. Mulheres com SOP devem ser informadas sobre o risco aumentado, mas reconhecendo que a probabilidade global de desenvolver câncer do endométrio é baixa; portanto, exame de rotina não é recomendado. Amenorreia não tratada de longa duração, peso elevado, DM tipo 2 e endométrio persistentemente espessado são adicionais à SOP como fatores de risco. As mulheres com SOP devem ser informadas sobre estratégias preventivas, incluindo controle de peso, regulação do ciclo e terapia regular com progestagênio. Quando excessiva espessura endometrial e sangramento de privação forem detectadas, deve-se considerar biópsia com análise histológica.

RISCO DE SOP E CARDIOMETABÓLICO EM PARENTES DE PRIMEIRO GRAU

Os profissionais de saúde podem considerar que os pais e irmãos de mulheres com SOP podem ter um aumento da prevalência de síndrome metabólica, DM 2 e hipertensão arterial. O risco cardiometabólico em parentes de primeiro grau de mulheres com SOP permanece inconclusivo.

Edição 10. Outubro/2023. Assessoria Médica – Lab Rede
Referência: Helena J Teede et al, The International PCOS Network, Recommendations from the 2023 international evidence-based guideline for the assessment and management of polycystic ovary syndrome, European Journal of Endocrinology, Volume 189, Issue 2, August 2023, Pages G43–G64, https://doi.org/10.1093/ejendo/lvad096.

© 1956-2024 - Laboratório São Paulo.
Todos os direitos reservados
WhatsApp